segunda-feira, 30 de outubro de 2006

Desabafo de Um Eleitor

Em agosto de 2002 eu fiquei “grávido” de meu filho. Naquele ano haveria eleições presidenciais e Fernando Henrique Cardoso estava terminando seu segundo mandato. Havia votado nele nas duas vezes em que concorreu e não tinha queixas graves em relação ao seu governo. Muito pelo contrário, atravessava um período de tranqüilidade financeira como não lembro de ter conhecido desde minha infância. Inflação controlada e poder aquisitivo em recuperação deixavam boa parte da população com uma sensação de que o barco navegava com vento de popa. Claro, falhas haviam e problemas eram conhecidos. Ao final de seu segundo mandato, FHC parecia ter perdido o entusiasmo no exercício de sua função e as coisas pareciam estar murchas.

Foi então que comecei a pensar se não seria aquele o momento de passar o poder para alguém que há mais de uma década o pleiteava. Alguém que ao longo dos anos apresentou um discurso radical, com idéias revolucionárias e de resultados discutíveis, que assustavam boa parte da população esclarecida. Em 2002, ao longo de mais uma corrida eleitoral, esta mesma pessoa aparecia com um discurso mais suave, menos radical e muito mais consistente. Nunca fui eleitor do Lula. Sempre me considerei um eleitor de centro-direita, e me identificava muito mais com as idéias e posturas do PSDB do que com o “revolucionismo” sugerido pelo PT. Em todas as eleições em que ele concorreu, sempre preferi seus adversários, mesmo quando este fora o Fernando Collor de Mello. Mas em 2003 haveria um novo cidadão no Palácio e um novo cidadão na minha casa. Pensei, analisei, repensei e achei que aquele momento era muito simbólico. Minha vida mudaria com a chegada de um filho e talvez fosse a hora do país também mudar.

Decidi votar no Lula muito mais pela vontade de dar ao meu filho um país diferente do que por acreditar cegamente no programa de governo apresentado por ele. Mesmo mostrando-se um profundo conhecedor de cada recanto deste país e de seus vários problemas, restava a dúvida quanto à sua capacidade administrativa. Faltava-lhe experiência como gestor público. Na verdade Lula não havia tido nenhum emprego desde que abandonou a vida sindical. Lula não era um homem letrado, com diplomas ou conhecedor de idiomas. Causava-me desconforto imaginá-lo viajando pelo mundo como nosso representante, freqüentando palácios, conversando com grandes líderes e possivelmente cometendo as mais variadas gafes. Mas havia um lado inquestionável do Lula. Sua origem humilde, sua luta ao lado dos mais fracos e sua honestidade. Isso fazia dele um político mais humano, mais parecido com o nosso povo e talvez desse a ele as melhores condições de nos representar no mais alto cargo da nação. Estes valores poderiam e deveriam suprir a falta das outros requisitos, como a cultura e a informação. E eu assim acreditei. Pela primeira vez estava decidido a votar nele. Meu cérebro e meu coração estavam convencidos de que era chegada a hora de dar a ele a chance de pegar no leme da nação. Hora de ver o que a esquerda, representada naquele homem simples, poderia fazer pelo país. Acompanhei cada jornal, cada propaganda eleitoral, cada debate e entrevista. Nada tinha contra José Serra, o homem que era apontado como exemplo até na ONU por sua conduta enquanto ministro da saúde. Mas Lula parecia ser mais, ter mais. Sua nova postura passava confiança.

No dia da eleição votei confiante como nunca havia votado em toda as vezes em que exerci meu direito de cidadão. Ainda que neste país o voto seja um dever, e não um direito. Mas isso é assunto para outro texto. Votei e voltei para casa para acompanhar a apuração de uma eleição praticamente decidida fosse no primeiro ou o segundo turno. No dia em que Lula foi declarado oficialmente o novo presidente do Brasil eu comprei duas edições do jornal O Globo. Uma eu li e outra eu guardei dentro de um saco plástico como uma relíquia. Ali estaria preservado o registro de um momento histórico. Mais tarde poderia mostrar para o meu filho todos os detalhes sobre o que talvez fosse o dia mais importante de nossa história. O dia em que o Brasil tomou um rumo novo e correto. Pode parecer exagero, mas estas eram exatamente as sensações que eu tinha naqueles dias. Não sei se pela paternidade, se pela mais pura e profunda esperança depositada num homem simples, mas o fato é que eu acreditava nisso tudo. Naquela época o mundo não andava bem das pernas, havia crises ao redor do planeta, mas por aqui os ares da renovação tornava mais fácil respirar no dia a dia.

No dia de sua posse estava grudado na televisão. Ouvia cada palavra do novo presidente e podia sentir cada emoção que ele demonstrava sem o menor pudor. Junto com ele eu me entusiasmei, me exasperei e até chorei. Suas palavras pareciam ser claramente improvisadas, como devem ser as palavras vindas de um homem simples. Suas frases nada rebuscadas soavam como históricas. “Que nunca mais, na história deste país, alguém ouse duvidar da capacidade do trabalhador brasileiro!”. A frase ecoava e era repetida à exaustão por todas as rádios e televisões do país. Estava fincado o marco zero de uma nova era. E acredito que até mesmo uma boa parte daqueles que votaram em seu adversário, pelo menos naquele momento, sentiram que algo de bom poderia realmente estar acontecendo.

Então minha esperança começou a ruir. E não me refiro apenas aos escândalos, negociatas, fraudes, desvios, mentiras e supostas traições. Mas me refiro também às atitudes e decisões de Lula enquanto presidente. É preciso que alguém explicite e desfie cada atitude e cada postura nociva que o novo presidente tomou. Porque Lula errou duas vezes. Errou quando perpetuou erros antigos, cometidos por governos anteriores e errou quando tentou mudar aquilo que aparentemente estava correto.

Gosto de política. Por gostar dela, tenho por hábito acompanhar as notícias do presente, ler sobre o passado e tentar desenhar o futuro. E por acompanhar, acabo entendendo sobre política e percebendo suas nuances e caminhos tortuosos. Entendo a política, aqui ou em qualquer lugar do mundo, como um jogo de xadrez. Na política, como no xadrez, às vezes é preciso sacrificar um cavalo para que se possa capturar um bispo. No xadrez, como na política, há aqueles que pensam no movimento que farão doze jogadas à frente e há aqueles que pensam apenas no próximo movimento. E ambos são democráticos: qualquer pessoa pode jogar xadrez, assim como qualquer pessoa pode entrar na política. E haverá pessoas brilhantes e medíocres nas duas situações. Mas pensar no Lula e nesta enorme decepção me incomoda. Principalmente porque ele deverá ser reeleito. Quem (sobre)viver verá.

sábado, 14 de outubro de 2006

Botando a preguiça de lado...

Já estava na hora. Foram anos escrevendo aqui e ali sobre tudo. Quem lia - quando alguém lia - sempre me estimulava a tornar público o que estava no papel. Por preguiça e uma pitada de covardia eu nunca me entusiasmei com a idéia. Hoje respirei fundo e então... Dei um puta espirro, porque tenho rinite alérgica e hoje está frio e chovendo. Depois de assoar o nariz, respirei superficialmente e aqui estou eu. Momento histórico. Palmas, lágrimas. Agradecimentos aos amigos e familiares. Sobe a música.