segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

KYW - Ü

E finalmente chegou a nova reforma ortográfica. Confesso que de início eu me assustei com a idéia. Ainda que eu seja um escritor eventual de poucos e suspeitos fãs, sei que tenho deficiências no uso da língua escrita. Embora meus poucos leitores estejam sempre elogiando meus textos, eu me encontro num nível médio em relação ao conhecimento da língua. Claro que eu não separo sujeito do verbo com vírgula mas tenho visíveis dificuldades no uso da crase.

O fato é que eu fui alfabetizado poucos anos depois da última grande reforma, quando os acentos diferencias foram extintos. Ortograficamente eu não tive dificuldades ao longo do meu período escolar. Meus problemas durante ente período estavam em outras disciplinas. Quem viveu nos anos 70 e 80 sabe do que estou falando. Na economia os zeros eram cortados das moedas e estas tiveram seu nome alterado inúmeras vezes. Consequências de uma inflação louca que, mais do que zeros, consumia nosso salário e paciência. E na geografia? Estados foram desmembrados e novos criados, territórios foram extintos, e a todas estas os estudantes rabiscando e remendando seus mapas.

Mas eu gostei desta nova reforma. Na verdade, assim que ouvi os rumores em relação ao trema, eu mesmo tratei de abolir o mesmo do meu teclado. Cheguei a alterar a correção automática no Word para não ser mais avisado de sua ausência como se aquilo fosse o fim do mundo. Sempre odiei o trema. Aqueles dois pontos em cima do "U" me incomodavam por vários motivos. Pra começar porque só o "U" é digno de usá-lo? Porque esta letra se acha tão mais importante que as outras para ter um sinal próprio? Assim como a cedilha e a crase o trema torna uma letra mais esnobe. Agudos, circunflexos e até o sinuoso til são usados por vogais em geral. Mas aqueles sinais arcaicos escolheram suas favoritas e a elas se agarraram com avareza. Vaia pra eles. Outro motivo pelo qual o trema me chateia é a sua alusão às linguas germânicas e nórdicas. Mas lá, diferente de cá, o trema é usado numa escala muito maior e com visível propósito fonético, alterando completamente a pronúncia da letra. Aqui era apenas uma questão de ler ou ignorar a presença do "U". Se o "U" não precisa ser pronunciado, que o retirem em vez de colocar os malditos pontos para chamar a atenção daqueles que precisam.

Quanto ao K, W e Y, só posso dizer uma coisa: nunca entendi porque eles eram clandestinos no alfabeto. Desde que me entendo por gente eles estavam lá, presentes no dia a dia. Eu escovava os dentes com Kolynos (para os mais novos, o antigo nome do dentifrício Sorriso), tinha um amigo chamado Wilson (que não era uma bola de vôlei) e me esbaldava tomando sorvete da Yopa (atual Nestlé). Agora aceitam estas letras como se elas tivessem surgido do nada, recém cunhadas por algum acadêmico? Então meu passado todo foi uma farsa criada em cima de letras que não existiam mas estavam ali? Fantasmas gráficos, espectros literários, falácias do vernáculo!

E o hífen? O que dizer de um tracinho que cheira a naftalina e que já estava tão fora de moda quanto o seu parônimo, o hímen. Pois que se rompam as regras e ambos sejam mandados para a posteridade. Reformas recebidas, aceitas e incorporadas, obrigado. Quem quiser beijar os falecidos que beije, porque vou fechar a tampa. Chega de exéquias. Descansem em paz.

Minha única preocupação é quanto ao que fazer com o espaço que acaba de vagar no meu teclado. O que colocar em cima do 6? Sugestões para o meu e-mail. Ou para o do Bill Gates, sei lá.

2 comentários:

Omnia disse...

Discordo plenamente de sua opinião a respeito do trema, visto que, diferentemente do que muitos gostam de afirmar, ele tinha sim uma utilidade de extrema importância. Obviamente, ninguém terá dificuldade para saber que o certo é pronunciar o U de "linguiça", entretanto, nem todos poderão saber a pronúncia correta de palavras menos conhecidas como "arguir", por exemplo, e tantas outras com as quais poderemos ter um primeiro contato somente através da leitura. Afirmar que se o U não é pronunciado, é melhor tirá-lo não faz sentido algum. Guitarra, sem U, seria "gitava", pronúncia que, por sua vez, é bastante diferente de güitarra, só para dar um exemplo simplório...

A escrita de uma língua deve ser absolutamente capaz de captar todos os nuances da fala oral. Com a extinção do trema, o português escrito perdeu essa capacidade, tornando dúbia a pronúncia de dezenas de palavras. Agora não nos bastará ler para saber como se fala; teremos que ouvir a pronúncia correta da palavra que vemos pela primeira vez no papel e isso é lastimável para uma língua escrita, seja ela qual for.

Ana Lúcia Prôa disse...

Querido amigo e querido ídolo,

Posso ser uma das suas poucas leitoras assíduas, mas sou a pessoa mais sincera do mundo. Se não gosto, não gosto, e acabou! E eu adoro o que vc escreve!!!!!!!!!!!! Fico de boca aberta com a ligação de idéias que vc faz (tipo hífen com hímen - fantástico!!!). Acho seu bom humor na medida certa e só lamento que mais pessoas ainda não conheçam seus textos e suas críticas ferinas.

Bem, li o que essa tal de Omnia (ou esse tal?) escreveu... Está no direito dela(e) de te criticar, porque, realmente, o trema tinha uma função em relação à pronúncia sim. Mas será que essa pessoa não conseguiu enxergar o quanto seu texto foi espirituoso? A parte do K,Y e W então... Grande sacada!

Eu, por exemplo, gostava muito do trema, pq me gabava por ser uma das poucas pessoas que sabia empregá-lo direitinho... Mas, enfim, aceito a mudança e, confesso, já me acostumei a muitas delas, graças à minha leitura diária do jornal O Globo. Todos os dias leio a palavra 'estreia' sem acento e já me acostumei! Embora eu ainda não esteja escrevendo conforme as novas regras...

Bem, voltando ao seu texto, PARABÉNS, PARABÉNS, PARABÉNS! (xiii... ainda tem esse acento em parabéns, né? Agora fiquei confusa, haha!)

BEIJOS!